A viscosidade
Mas e o arrasto induzido? Ora, também aqui existe mais de uma possibilidade de abordar o problema. Basicamente, pode-se recorrer a três pontos de vista diversos. O mais simples se vale de considerações energéticas. Nessa linha de pensamento, observa-se que a inevitável geração dos vórtices de ponta de asa requer um gasto energético. Como tais vórtices não contribuem em nada para a sustentação, e como a única fonte de energia (no sentido clássico de “capacidade para realizar trabalho”) na aeronave é o seu sistema propulsor, a energia gasta para gerar tais vórtices que não servem para nada representam um gasto de energia que é retirado daquilo que serve para gerar propulsão. Como a propulsão é a força que se opõe ao arrasto, um “desperdício” de propulsão é o mesmo que um “aumento de arrasto”, que é identificado ao arrasto induzido.
Uma outra abordagem, mais interessante do ponto de vista da engenharia, recorre a complicadas formulações matemáticas baseadas na teoria de Prandtl dos filamentos de vórtices. Trata-se da única forma, além daquela experimental, de se calcular ou ao menos estimar o valor do arrasto induzido, e por isso é mais interessante do ponto de vista técnico. No entanto, se o leitor é um engenheiro, ele a conhecerá ou poderá ter acesso a ela facilmente. Se não o é, apresenta-la aqui provavelmente assustará o leitor! Portanto, recorreremos à terceira via, bem mais simples e intuitiva, e igualmente legítima.
Lembremo-nos antes de tudo que o ar é um fluído viscoso. Certamente não é tão viscoso quanto o mel, mas é certamente viscoso. Mas o que é a viscosidade? Podemos definir a viscosidade como uma espécie de “atrito interno” em um fluido. Trata-se do quanto um fluido se opõe à sua própria deformação. Para deixar o conceito suficientemente claro, recorremos à definição em sua origem, descrevendo de uma forma ligeiramente adaptada os experimentos do próprio Newton. A figura abaixo ilustra o que está em questão:
Suponhamos aí um canal com uma certa profundidade (z) onde se encontra um fluido, por exemplo água, em estado de repouso. Em seguida, aplicamos a um corpo boiando no fluido uma força (F) grande o suficiente para mantê-lo em movimento a uma velocidade constante (V). O que se observa? Em primeiro lugar, observa-se que o fluido imediatamente em contato com o corpo em movimento passa a se mover junto com ele na mesma velocidade. É, por assim dizer, arrastado pelo corpo. Por outro lado, o fluido em contato com o fundo do canal, que permanece parado, como está em contato com a parede do fundo do canal tem a velocidade desta, isto é, zero. Ou seja, no extremo inferior, a velocidade do fluido é nula, no extremo superior é idêntica àquela do corpo em movimento.
Mas o principal a se observar é que entre esses dois extremos nasce um gradiente de velocidade (∂V/∂z). Em outras palavras, de zero no fundo a V na superfície, a velocidade varia com uma certa proporção em função da distância aos dois extremos. Ora, eis o que é a viscosidade: esta é exatamente o que define a proporção em questão. Apenas para sermos completos, damos a fórmula encontrada por Newton:
Onde τ (tau) é a solicitação de cisalhamento, e A é a área do corpo em contato com o fluido. O termo indicado com a letra grega μ (mu) define a proporcionalidade ente o gradiente de velocidade que é criado em função da força aplicada. Não entraremos em maiores detalhes a respeito da natureza da viscosidade. Basta que esteja claro que, graças a essa propriedade, se temos um “estrato” de fluido em movimento, este estrato tende a arrastar consigo os estratos adjacentes. Aqueles estratos com velocidade maior tendem a acelerar aqueles com velocidade menor e, vice versa, aqueles com velocidade menor tendem a desacelerar aqueles com velocidade maior. Em outras palavras, é como se cada estrato “grudasse” nos estratos adjacentes, daí a ideia de “atrito interno” para caracterizar a viscosidade.
Eis que estamos prontos para compreender o arrasto induzido.